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Eu hesitei em escrever esse texto porque não me achei suficientemente boa para escrevê-lo. Esse sentimento reflete, em parte, isso que em algum momento uma de nós sente. Pequenês, insuficiência, insegurança. Estamos à mercê deles, não sabemos para onde ir. O que fazer quando nos achamos uma fraude?

Tenho o grande prazer de ter uma amiga linda, engraçada, dedicada, uma profissional venerada. Ela fez mestrado trabalhando, tudo isso em São Paulo, o que já acho um feito incrível. Detalhe: trabalhando em dois empregos. Ela faz Doutorado, comprou um apartamento, faz milhões de coisas. Daquelas amigas que eu sinto orgulho em ter. Pena que não nos encontramos muito, nossas agendas nunca batem. Esses dias deu certo e logo que nos sentamos, ela disparou: “eu me sinto uma fraude”.

Foi um grande balde d’água fria. Fiquei um pouco sem reação, controlando minha cabeça para não metralhar tudo de uma vez o que ela representa para mim, o orgulho que eu sinto de acompanhá-la, mesmo que nas redes sociais, tudo que ela tem de incrível. Tentei entender o que ela sentia e fui percebendo que ela não é a única. Vez ou outra estou no mesmo barco. As outras três amigas com que eu conversei esta semana, também.

O que movimenta esse sentimento de que somos impostoras no mundo? De que não somos suficientemente boas, de que estamos aquém de onde deveríamos estar? Por que as mulheres, principalmente as da faixa dos 30, mas não só, têm dificuldade de se reconhecer no mundo, como as profissionais, mães, amigas, estudantes, namoradas ou esposas maravilhosas que são? Eu disse para uma outra amiga – também maravilhosa, mas que dizia se sentir incapaz – que questionava muito os padrões que a gente se impunha. Nós, mulheres, com tantos indicadores na vida, tantos que às vezes acredito que o fato de conquistarmos o mercado de trabalho nos deu de presente só mais um dos ambientes em que também temos que ser excelentes.

Temos.

A pressão pode ser da sociedade, mas ela está aqui dentro. Essa minha outra amiga disse que a questão não era um padrão inatingível, porque ela não atingia nem o mínimo. E acrescentou algo que me sensibilizou: “sei que eu sou boa, que faço muito, que está tudo bem, ok, só que hoje esse discurso não cola”. E por que não cola, me pergunto. O que faz uma mulher incrível se achar tão, mas tão pequena, que não atinge o mínimo? Qual é o mínimo? Por que fazem isso com a gente? E por que a gente não consegue se libertar?

Para qualquer canto em que você olhe, tem uma mulher vivendo a síndrome da impostora. Se achando uma fraude, um lixo. Achando que não está fazendo nada demais no mundo. Um monte de mulher grande se sentindo bem, bem pequenininha. Se sentindo mal sucedida, fracassada, detestando seu corpo. Tem mulher se desculpando por não ser o que se espera dela. O que ela acha que esperam dela. O que ela mesma espera dela. Tem outra mulher se sentindo sozinha. Se você reparar bem, tem uma mulher dando os créditos de suas conquistas para os outros. Tem uma mulher apagando a selfie recém-postada porque se arrependeu. Se achou feia. Tem um monte de mulher apagando suas fotos. Tem um monte de mulher se apagando.

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A fundadora e CEO da Girls Who Code (Garotas que programam), Reshma Saujani, falou neste TED que é preciso ensinar as nossas meninas a serem corajosas, não perfeitas. Eu cresci tendo que ser perfeita. Para os outros, para mim. Eu olho para o lado e vejo dezenas com esse mesmo padrão. E é mesmo difícil esquecer o que uma vida inteira te mandaram ser.

Um dos exemplos que Reshma dá em sua fala é que homens candidatam-se a um emprego se atenderem apenas 60% dos requisitos. Mas as mulheres candidatam-se somente se tiverem 100% dos requisitos. Outro exemplo vem da sua própria escola de programação. Quando as meninas estão aprendendo a programar, é comum uma delas chamar a professora e dizer: “Não sei que código escrever”. A professora olha para a tela da garota e vê um editor de texto em branco. Acontece que a aluna não passou os últimos 20 minutos apenas olhando para a tela. Ela escreveu um código, mas o apagou em seguida. Prefere não mostrar nada que mostrar algo errado.

Programação é um processo. Um processo de erro e acerto, de aprendizado. De tentar e às vezes falhar, mas se reerguer sempre. E tentar de novo. Parece familiar? É, porque a vida é assim. Por isso, quando a autopercepção te pregar uma peça, se veja neste caminho. Seu primeiro emprego será seu primeiro emprego, seu primeiro mês na empresa nova é o primeiro mês numa empresa nova. Seu trabalho de conclusão de curso será o resultado do seu esforço, de um aprendizado.

 

Você está aprendendo

Você não sabe tudo, é por isso que está aprendendo. Poderia dar mil exemplos para mostrar que o lugar que estamos é caminho. E esse caminho é lindo. Posso apostar que você está se esforçando de forma exemplar para estar nele. Não é que você conseguiu porque os outros não se esforçaram mais, mas sim pela sua capacidade. Caminho não é ponto final e pode ser que esse ponto final nunca chegue. Não nos frustremos. A gente já está fazendo muita coisa.

Se não nos enxergamos, outra saída para amenizar essa síndrome é: enxergue. Perceba as mulheres maravilhosas que estão ao seu redor. Diga isso para elas. Fortaleça seus olhares sobre si mesmas. Isso não é balela. Quando uma mulher compara a sua autopercepção com o que enxergam nela e vê que isso não bate, há de se acender uma luzinha de que algo está errado. Ela pode entender que está se cobrando muito ou reconhecer seu caminho. Não se esqueça de fazer isso por você mesma. Pelas outras. Não se renda a comparações fúteis. Quando você entra nessa corrente, é difícil dela se quebrar.

 

TATIANA LAZZAROTTO

Jornalista | Escritora | Feminista | Louca por plantas. Em busca do meu propósito :)

17 de setembro de 2020 — Caroline Alves

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